O campeão de vendas e a nota zero no crash-test. O que será da imagem do Onix
Saiba como a segurança, que ainda não está na lista de prioridades dos brasileiros, pode impactar as vendas do Chevrolet e de outros carros
Na GM foi surpreendida pela divulgação de uma nota terrível do seu campeão de vendas, o Chevrolet Onix, no teste de colisão do instituto LatinNCAP, em pleno lançamento de sua linha 2018. Nota zero em proteção para quem viaja nos bancos dianteiros, e de três estrelas (em cinco possíveis) para crianças nos bancos de trás. Para piorar, a Proteste, agência de defesa do consumidor está promovendo um abaixo assinado para pedir às autoridades a proibição de vendas do Onix e o recall de todas as unidades vendidas – e já foram mais de 625 mil. Trata-se sem dúvida de um exagero, e não deve prosperar, pois não há fundamento legal que justifique essa ação.
A montadora defendeu-se dizendo que o Chevrolet Onix atende às normas de segurança do país (se não atendesse não estaria homologado há tantos anos) e que o hatch supera seus concorrentes em matéria de segurança (este sim um posicionamento digno de nota, caso correto). A questão que pretendo analisar aqui é o potencial de dano que essa informação pode ter à imagem do carro que caminha a passos largos para seu terceiro ano como o mais vendido do país. E a outros carros que tiverem avaliações de segurança tão ruins (e serão muitos em breve), mesmo que ainda se questionem alguns critérios do LatinNCAP.
Em primeiro lugar, vale destacar que o quesito “segurança” não aparece nem no Top 10 da lista de prioridades na decisão de compra. Para carros de passeio, os cinco mais citados são “experiência anterior”, “reputação da marca”, “design”, “consumo” e “preço”, todos com mais de 20% de citações nas pesquisas. Segurança não chega a 8% das menções.
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É público e notório que o comprador, na hora de escolher os opcionais e acessórios do carro, privilegia itens de comodidade, conectividade (cada vez mais) e principalmente adereços estéticos, em detrimento de equipamentos de segurança. A sensação dele, segundo as pesquisas, é que os carros são naturalmente mais seguros do que antes, e que a lei já o protege, tornando obrigatórios itens como airbags frontais e freios ABS.
Mas mesmo não sendo prioridade, a segurança está no radar dos clientes, e as cenas de um habitáculo deformando em demasia num crash-test assustam demais. Além disso, zero estrela é muito emblemático, algo que só se esperava anos atrás de incipientes modelos chineses (e que atrapalhou muito a imagem desses fabricantes em sua tentativa de ganhar outros mercados).
Portanto, é evidente que a GM do Brasil está diante de um problemão que demandará uma estratégia conjunta de suas áreas técnicas e de comunicação. Alguma resposta precisa ser
dada ainda nesta geração do modelo, e não apenas na próxima, que só chega na virada da década. Introdução de airbags laterais e cintos com pré-tensionadores? Talvez. Novos reforços estruturais na célula de sobrevivência? Isso é um pouco mais complicado.
Até o fato de o Onix ser o carro mais vendido do Brasil torna-se um fardo num momento desses, pois ajuda na propagação da péssima nota nas redes sociais. Pode, sim, espantar alguns clientes e causar certa desconfiança nos donos do carro. O desafio da GM é não deixar o seu campeão ficar com má reputação. Algo que já abreviou a vida do Fiat Tipo que pegava fogo, ou atrapalhou o Ford Explorer que capotava com facilidade, o Mercedes Classe A vitimado no teste do alce, o Toyota Corolla cujo tapete prendia no acelerador, só para citar casos mais emblemáticos. No caso do Onix, não há defeito. Mas o projeto está em cheque por causa da baixa nota. Os testes de colisão feitos por institutos independentes têm feito muito pela boa ou má reputação dos automóveis. As cinco estrelas obtidas por modelos como Ford Focus, Jeep Renegade, Honda HR-V e VW Up, por exemplo, foram fartamente usadas pela publicidade dessas marcas no Brasil.
Outros modelos que passaram por testes de colisão
Mas desde o ano passado as regras no LatinNCAP foram revistas e ficaram bem mais rigorosas. Quem tirou cinco estrelas antes, dificilmente repetirá a dose em novos testes. O próprio Onix tinha obtido três estrelas para adultos e duas para crianças há menos de três anos. Despencou para zero no primeiro, mas subiu para três no segundo. Notas baixas têm sido uma constante nos testes mais recentes, e deverão continuar sendo.
Outras notas zero que surgirem podem atenuar a sombra que paira hoje sobre o Chevrolet Onix, e que encobre até seu derivado, o sedã Prisma, outro sucesso absoluto de vendas. Por outro lado, notas um pouco melhores poderão complicar a vida do líder, sobretudo se vierem em rivais que estão a caminho, com o Fiat Argo e o novo VW Polo.
O resumo da ópera é que esses testes só chamam a atenção da mídia e do público em casos extremos, quando o carro obtém cinco estrelas, ou quando zera em alguma das aferições (para adultos ou crianças). Sair-se razoavelmente bem nesses testes passa a ser uma nova imposição para os fabricantes, mesmo que os clientes ainda relevem a um segundo plano a questão da segurança. Para carros, a imagem e a qualidade percebida são fundamentais na precificação (leia-se boas margens de lucro) e no desempenho de vendas.